Como transformar o ponto do restaurante num sucesso de público

O ponto comercial responde pelo fracasso do negócio? Em parte, sim. Muitos colocam na localização a culpa pelo malogro do negócio, mas especialistas e empresários mostram que, além de um bom endereço, é necessário buscar o diferencial e o exclusivo, para cativar clientes e encontrar a sustentabilidade do empreendimento.

ponto_1.jpgCardápio definido. Mesas postas. Panelas borbulhando na cozinha. Tudo absolutamente checado em cada detalhe, para receber o mais importante personagem da história de um restaurante: o cliente. Ele virá?
A resposta depende de uma série de fatores que leva a clientela a decidir-se por um ou por outro restaurante. Diante de tamanha concorrência no setor, vários motivos influenciam na escolha e têm peso decisivo para o sucesso ou o fracasso do negócio, incluindo sua localização ou o ponto comercial. Estar situado em um ponto conveniente pode ser uma questão de sobrevivência nesse ramo, sobretudo em regiões metropolitanas e nas grandes cidades, onde os restaurantes surgem com impressionante rapidez, porém desaparecem na mesma velocidade. Mesmo assim, lembram os especialistas – a escolha do ponto comercial nem sempre recebe o devido tratamento.

O valor de um imóvel (compra ou aluguel) influi sobremaneira na decisão, porém muitas vezes errônea, o que leva a perdas irrecuperáveis dos investimentos. Mas existem outros fatores que devem ser estudados: os acessos, a visibilidade, os ruídos, os vizinhos, o fluxo de pessoas e a incômoda concorrência. “Escolher um ponto comercial requer estudos
detalhados, onde muitas variáveis são combinadas para se chegar a um correto diagnóstico” explica João Abdalla Neto, consultor de marketing do Sebrae-SP, entidade nacional de apoio aos micros e pequenos negócios. Tudo se resume a detalhes técnicos, que muitas vezes passam batidos aos olhos do investidor. Pense naquela curva chinfrim. Pois bem, esse detalhe viário pode diminuir ou retirar toda a visibilidade do restaurante.
Mas existem outras barreiras – naturais ou da infra-estrutura urbana – que fazem um ponto comercial difícil ou sem atrativos, o que requer maiores investimentos na promoção
e comunicação do restaurante. Quando nada cresce no local, tem-se o chamado ponto “micado”, termo defendido por uns e rebatido por outros. Ladeiras acentuadas ponto_2.jpgatrapalham. Linhas de trem, grades divisórias de faixas de trânsito, corredores de ônibus, pistas de tráfego local, bancas de revistas, calçadões, falta de estacionamento etc. também
representam problemas. Viadutos? Nem pensar. Melhor manter-se distante deles, pois depreciam o meio ambiente urbano, como o Elevado Costa e Silva (Minhocão), em São Paulo, e as vias elevadas, na zona portuária do Rio de Janeiro. Ponto de ônibus pode ser um entrave ou não, depende do perfil do restaurante. Os mais populares e os botecos levam vantagens nesse caso, mas uma casa de nível mais alto pode ter a sua carteira de
clientes diminuída pelo costumeiro caos de uma parada de coletivos.

Vários tipos de vizinhos podem se tornar um problema, como as casas funerárias, que definitivamente não combinam com culinária. Para Abdalla Neto, não existe ponto micado. Ou seja, tudo depende de haver coincidência entre as propostas do empreendimento com o perfil da região escolhida e dos potenciais clientes, como o poder de consumo e receptividade a determinados produtos e serviços. Esses dados são obtidos por meio de pesquisa de campo, onde todas as variáveis de viabilidade são aferidas e compõem um pacote de informações decisivas para a sustentabilidade do restaurante. “Informação é tudo”, resume.

A fim de ilustrar, o consultor do Sebrae relembra o caso de um empresário que – por causa do baixo preço do aluguel e excelente localização – comprou um restaurante em frente ao Fórum de Santana, na capital paulista, que três meses depois se mudou para outro prédio. O vendedor sabia da iminente transferência. O comprador desavisado amargou prejuízos, com a queda de fluxo de transeuntes. “Faltou pesquisa antes da tomada de decisão”, diz Abdalla Neto. Transformar pontos desfavoráveis em recantos atrativos pode ser muito penoso, mas não impossível. Requer investimentos pesados – financeiros e institucionais – na promoção do diferencial, da exclusividade. Portanto, o local deve ser escolhido mediante conceitos consagrados no mercado. No final dos anos
90, a cozinheira baiana Dadá transformou seu restaurante Tempero da Dadá (rebatizado como Varal da Dadá) em um sucesso nacional de crítica e de público. Detalhe: o restaurante da Dadá fica no bairro Federação, no Alto das Pombas, uma das zonas mais pobres de Salvador e, teoricamente, um ponto desfavorável. O diferencial, como discorrem os especialistas, está na alquimia de sabores e aromas que vem da cozinha e na capacidade da proprietária de se expor, com seu modo simples e sorriso farto, na mídia
especializada no setor, sobretudo na televisão. Resultado: uma segunda casa foi aberta no coração do Centro Histórico do Pelourinho, que preenche todos os requisitos de um bom ponto: visibilidade, acesso e com um fluxo de pessoas sem nenhuma pressa e com poder de consumo. Mas nem todo mundo tem uma pata de coelho no bolso. Para entrar no ramo ou mesmo para ampliar o restaurante, com a firmeza requerida, pode-se recorrer a um rol de metodologias científicas.

“O primeiro passo será definir o ponto_3.jpgpúblico-alvo e levantar todas as informações possíveis, focar todos os esforços no cliente potencial” diz o consultor da Faculdade Senac de Turismo e Hotelaria, Alexandre Mota – um especialista em gestão para turismo e hotelaria. Definido o público-alvo, estudada a concorrência, a escolha do ponto comercial deve ser norteada pela combinação do trinômio: local, visibilidade e acesso. “Nada adianta estar numa superesquina, mas com acesso difícil”, diz Mota. Quando os fundamentos não são observados – e isso se mostra muito freqüente – a chance de o negócio sair errado tende a ser maior. Culpa do ponto? Nem sempre. Um trabalho de reposicionamento pode diagnosticar os problemas. Além do ponto, um cardápio mal elaborado, a ambientação em desacordo com o perfil do público, os preços inadequados ao público-alvo, o atendimento incorreto, podem ser o portão para a chegada da crise. Todos esses fundamentos balizaram a montagem do recém-inaugurado Aneto, com capacidade para 380 pessoas, num ponto comercial do Jabaquara, em São Paulo, onde outros três empreendimentos sucumbiram tempos atrás. Em dois meses, a casa contabiliza mais de 500 clientes por dia, que buscam o bufê no sistema por quilo, elaborado pelo chefe Carlos Soares, que tem passagem por diversos templos brasileiros da gastronomia brasileira. Por um bom tempo, a empresária Elza Nunes (do tradicional Dona Lucinha) estudou e observou minuciosamente o comportamento do público-alvo do Aneto, estimado em mais de 12 mil executivos e funcionários de grandes empresas, bancos e multinacionais da região. “São pessoas que passam o dia todo sentadas no escritório e que buscam um cardápio muito leve e trocado diariamente, com pratos das cozinhas brasileira e internacional”, conta Elza Nunes.

Uma pesquisa de mercado preparou o caminho para a abertura de O Chefão, na cidade de Americana, no interior de São Paulo, num ponto de um restaurante que fechou as portas 20 anos atrás. Instalado num casarão de sete décadas, dos tempos áureos do café, com 900 metros de área construída, em um terreno de 2 mil metros quadrados, a casa ostenta quatro ambientes: um fone-bar, uma pizzaria, um sushi-bar e uma choperia na parte externa e jardim. Na média, o público está entre 600 e 800 pessoas/dia, podendo chegar a 1.200 clientes/dia nos finais de semana. “Uma pesquisa mostrou que esse era o local ideal, mas precisava de uma ampla reforma. Decidimos bancar o investimento para oferecer um local diferente, especial, e está dando muito certo”, conta Ivan Ângelo Bankoff, um dos quatro sócios-proprietários. “O público busca experiências agradáveis;
o restaurante deve estar preparado para isso”, diz Alexandre Mota do Senac. Nesse quesito, o Café Girondino mostra-se insuperável ao resgatar uma parte da história paulistana e do glamour do ciclo cafeeiro. Encravado no centro velho da cidade de São Paulo, que passa por um processo de revitalização, o café-restaurante-choperia recria o ambiente de um café de mesmo nome, que funcionou entre 1822 e 1917. Móveis, mesas, cadeiras, balcões, piso e escadaria foram produzidos depois de intensas pesquisas em acervos fotográficos de museus e bibliotecas. Tem boa visibilidade, oferecida pelo espaço amplo e aberto do Largo São Bento, é facilmente acessível para pedestres, por estar numa ponta de rua fechada aos veículos e na saída de uma estação do metrô. O Café Girondino convive com intenso fluxo diurno (pelo centro paulistano circulam 3 milhões de pessoas/dia) e com um imenso vazio humano durante a noite. Somando o público do cafezinho e restaurante, são mais de 1.500 pessoas por dia. “Há muito preconceito em relação ao ponto, por estar no centro. Mas conquistamos nosso público-alvo: pessoas
que circulam na região ou trabalham no centro velho e buscam um restaurante de nível acima da concorrência”, diz o sócio-proprietário Carlos Alberto Messias.

 

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